Comentários sobre o artigo 1°, da Lei 9.307, de 23.09.1996

Fonte: Revista Resultado ano I nº 2 – ano 2004

Data: Maio/2004

Autora:Ângela Mendonça Advogada e consultora CACB

“Art. 1° As pessoas capazes de contratar poderão valer-se da arbitragem para dirimir litígios relativos a direitos patrimoniais disponíveis.”

O primeiro artigo da lei brasileira delimita o campo de aplicação da arbitragem: em relação a quem pode utilizar, e ao tipo de discussão jurídica em que pode ser utilizada. São os requisitos para o uso da arbitragem, ou pressupostos para o seu emprego. Em linguagem técnica denomina-se arbitrabilidade.

Tal conjunto de requisitos se classifica em:
a) Subjetivos: - capacidade civil das partes(capacidade para contratar)
b) Objetivo: - ocorrência de um conflito de interesses envolvendo direitos patrimoniais disponíveis.

Trata da lei do requisito subjetivo para o uso da arbitragem, quando estabelece no texto do artigo: “As pessoas capazes de contratar poderão valer-se da arbitragem.....”
Seu conteúdo quer dizer que somente as pessoas em pleno exercício de sua personalidade, ou seja, aquelas que estão aptas a praticar os atos da vida civil, sem a necessidade de complementar essa pratica com a ação ou vontade de outrem (juiz, tutor, curador, representante ou assistente), podem manifestar livremente a sua vontade, sendo assim, admitidas a se valer da arbitragem.

Em linguagem simplista pode-se dizer que, da mesma forma que a parte eventualmente lesada em seu direito pode deixar de pedir ao Estado o restabelecimento do direito violado, não se valendo, assim, da jurisdição pode ela convencionar com a parte contraria uma outra “via” para pôr fim ao conflito gerado pelo ataque ao seu direito.

Esse consenso resultante do exercício da vontade livremente expressa, e a base e o fundamento da arbitragem, cujo o emprego exige, alem de partes capazes para contratar, a caracterização de requisito objetivos, tais como: a existência de um conflito de interesses e a vinculação do conflito a um direito patrimonial disponível.

O conflito de interesses, como elemento de base, pode ser definido como um choque de duas ou mais vontades sobre o mesmo “bem”, entendendo-se como bem, tudo que pode satisfazer a uma necessidade humana (individual ou coletiva), distinguindo-se, em tão, em bens materiais ou coisas os que são palpáveis e que se pode tocar; e bens imateriais ou morais os que são intangíveis, que não se podem ver nem pegar. As duas categorias são escassas, o que propicia a projeção de duas ou mais vontades sobre um mesmo bem, que, apto à satisfação de ambas necessidades a que se vincula, denomina-se interesse.

O outro requisito objetivo é que os interesses em disputa versem sobre direitos patrimoniais disponíveis. São patrimoniais os direitos que se referem a bens susceptíveis de avaliação econômica ou monetária, e disponíveis os direitos relativos a bens apropriáveis ou alienáveis, o que significa dizer: os que estão no comercio jurídico.

Censura-se desde logo, em afinidade aos ensinamento do saudoso mestre Cláudio Vianna de Lima, a impropriedade terminológica da lei, adotada na parte final do artigo, pela falta de distinção de fenômeno, que caracteriza a preocupação da Ciência. O vocábulo “litígio” utilizado em lugar de conflito, pendência, divergência, controvérsia etc., afasta-se das espécies no processo comum, onde “litígio” caracteriza-se como o fenômeno do conflito levado a juízo e “lide” como o conflito de interesse que o juiz deve resolver.