30/01/2004 - JURISPRUDÊNCIA FOI POSITIVA PARA A ARBITRAGEM NOS ÚLTIMOS DOIS ANOS

Veículo: Valor Econômico - Seção: Legislação & Tributos

Autor: Zínia Baeta, De São Paulo

 

Justiça privada Processos julgados ratificaram pontos da lei que ainda geram controvérsias

Os dois últimos anos são considerados importantes para a arbitragem no Brasil. A opinião de advogados da área não se baseia apenas no crescimento do uso do método extrajudicial para solução de conflitos no país, mas também nas decisões judiciais proferidas ao longo de 2002 e 2003 interpretando pontos da Lei de Arbitragem (Lei nº 9.307, de 1996) que ainda geram dúvidas.

Dentre essas decisões, conforme especialistas, há diversos julgamentos - da primeira instância ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) - que confirmaram o efeito vinculante da cláusula arbitral, que, uma vez escolhida, deve ser o meio empregado na solução do possível conflito. Apesar de o Supremo Tribunal Federal (STF) já ter reconhecido a constitucionalidade da Lei de Arbitragem, cada nova decisão contribui para consolidar a nascente jurisprudência da área. "Isso já está pacífico, quando há cláusulas bem redigidas é difícil ter problemas", afirma a advogada especializada em arbitragem, Adriana Noemi Pucci, do Veirano Advogados. Em 2003, por exemplo, o juiz da 1ª Vara Cível de Caruaru, em Pernambuco, se julgou incompetente para analisar um litígio entre uma franquia e um franqueador daquele município, cujo contrato trazia a cláusula arbitral, elegendo um centro de mediação e arbitragem do Estado para solucionar futuros problemas. A advogada Selma Lemes, especialista em arbitragem, cita como precedente do STJ em 2003 um caso envolvendo a Americel, a Compushopping Informática e outras empresas que recorreram à Justiça para que o procedimento arbitral, questionado pela empresa de telefonia, fosse instituído. Todas as instâncias confirmaram o compromisso arbitral, validamente instituído. "Essa decisão é importante, pois é uma das primeiras manifestações do STJ sobre o tema", afirma Selma.

Dentre os precedentes citadas por especialistas está um acórdão da Sétima Câmara Cível do Primeiro Tribunal de Alçada (TAC) de São Paulo, do fim de 2002, que reconheceu a possibilidade de, no procedimento arbitral, a parte escolher a legislação que será aplicada na solução do conflito. Outro julgamento da Justiça paulista é a decisão da Quinta Câmara de Direito do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP) envolvendo a Renault do Brasil e distribuidoras.

No caso em questão, as distribuidoras pediam a anulação da sentença arbitral proferida em uma câmara instalada fora do Brasil. De acordo com o presidente do Comitê Brasileiro de Arbitragem (CBAR), João Bosco Lee, o TJSP julgou - em agravo de instrumento - que não era competente para analisar uma sentença estrangeira e que cabe ao STF homologá-la ou não. Segundo ele, a parte que não concordar com o resultado da sentença arbitral estrangeira deve comprovar perante o Supremo que a decisão não pode ser homologada e, portanto, ser reconhecida. Lee explica que há previsões na Lei de Arbitragem para essas situações, como a decisão que viole a ordem pública ou que o direito de defesa das partes tenha sido cerceado.

Apesar de algumas questões já estarem firmando jurisprudência no Brasil e por isso oferecerem maior segurança jurídica, especialistas afirmam que ainda há uma série de conceitos da legislação da arbitragem que devem ser analisados e esclarecidos pela Judiciário. A advogada Adriana Pucci afirma que a possibilidade do Estado firmar contratos com cláusulas arbitrais é ainda um ponto controverso, pois há a corrente jurídica que defende a possibilidade e outra que vai contra. "Não está muito claro na legislação que se possa utilizar a arbitragem nos contratos com o Estado, falta ainda uma definição", diz. Já a advogada Selma Lemes afirma que a cláusula de separabilidade prevista na Lei de Arbitragem também precisa ser submetida ao Judiciário. Selma diz que a legislação prevê que a cláusula arbitral seria independente do restante do contrato do qual faz parte. Para a advogada, se a validade do contrato for contestada, ela deve ser discutida na arbitragem e não no Judiciário. "Este é um ponto interessante da lei para ser ratificado pelo Judiciário", diz.

Copel gera discussão polêmica no Judiciário

Zínia Baeta, De São Paulo

Uma das decisões mais comentadas no ano passado em relação à arbitragem foi da Justiça do Paraná, no caso da Companhia Paranaense de Energia (Copel). A empresa obteve na primeira instância uma liminar, confirmada pelo Tribunal de Justiça do Estado, que declarou nula a cláusula arbitral presente em um contrato assinado pela companhia com a UEG Araucária - uma sociedade formada com outras duas empresas para a construção de uma usina termelétrica.

O advogado da Copel, Marcelo Antônio Muriel, do Pinheiro Neto Advogados, afirma que no decorrer do contrato, que não foi aprovado pela Agência Nacional de Energia (Aneel), surgiram inúmeros problemas e que a companhia não quis levá-lo adiante. O advogado explica que a empresa recorreu à Justiça para que haja uma definição, pelo Judiciário, do meio que deverá ser utilizado para solucionar a controvérsia. "Esta é uma situação de insegurança jurídica e tomamos a iniciativa de levar ao Judiciário este problema, queremos que se defina de antemão onde a discussão será travada", diz. Muriel afirma que, para a cláusula arbitral ter validade em um contrato público, há a necessidade de previsão legal, o que não ocorre com a Copel. Segundo ele, a Petrobras, por exemplo, está autorizada por lei a adotar a cláusula arbitral em seus contratos. Muriel defende que o administrador público só pode fazer aquilo que está na legislação e que a Lei de Arbitragem não é clara quanto à sua aplicação ao Estado.

Já a Lei de Licitações, diz, só fala da eleição de foro para a solução de controvérsias, o que para ele pode significar a instituição do Judiciário.

 

 

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