21/8/2003 - A arbitragem na solução de conflitos

Fonte: Gazeta Mercantil
Autor: Camila Sant'ana David de Souza

A arbitragem é instrumento para solução de litígios, sem que haja necessidade de recorrer-se à esfera judicial. Para ser aplicável, a arbitragem tem que estar prevista, através da cláusula compromissória, no contrato que as partes interessadas buscarão executar, ou através de compromisso arbitral.

Particularmente à cláusula compromissória, havendo a inexecução do contrato em que se encontra inserida, a controvérsia – de ordem técnica ou de ordem jurídica –, é levada à solução pelo árbitro ou tribunal arbitral constituído.

Foi a partir da década de 80 que a arbitragem ganhou força dentro do processo de globalização econômica. Podemos destacar, no Mercosul, alguns protocolos que incluíam a arbitragem: Protocolo de Brasília para Solução de Controvérsias entre os Estados Partes; o Protocolo de Ouro Preto e a Convenção sobre Arbitragem Comercial Privada.

Internamente, a arbitragem passou a ser reconhecida como meio de solução de controvérsias com a edição da Lei 9.307/96, sendo pacificado o debate sobre sua constitucionalidade em 2001 pelo Supremo Tribunal Federal.

Devido à sua maior aplicação nos contratos privados, a instituição da cláusula compromissória em contratos administrativos vem enfrentando debates. Por isso, tem-se discutido até que ponto a arbitragem poderá ser utilizada para solucionar questões de interesses patrimoniais disponíveis que envolvam o Estado ou seus entes representantes.

Em Direito Administrativo, podemos considerar a arbitragem relacionada com as matérias que afetam o poder de gestão interna dos interesses da Administração Pública. O poder de gestão é utilizado pela Administração para decidir questões que não envolvam, preponderantemente, o interesse público, permitindo então a transação dos interesses envolvidos. Somente nestes casos é que se tem admitido o uso da arbitragem contratos administrativos.

Neste sentido, há dispositivos legais que permitem tal entendimento. Um deles vem expresso na Lei do Processo Administrativo no âmbito Federal (lei 8.987/95), que determina que nos contratos de concessão de serviços públicos esteja presente, como cláusula essencial, aquela relativa ao foro e ao modo de solução das divergências contratuais.

O próprio STJ entendeu que a Lei de Licitação (lei 8.666/93) é o marco introdutor da instância arbitral no direito administrativo, na medida em que permite, através de dispositivo expresso, a aplicação supletiva das disposições de direito privado nos contratos administrativos. Disto decorre que é admissível a escolha do juízo arbitral como meio para solucionar questões contratuais, desde que o edital de licitação discipline a abrangência das disposições de direito privado aplicáveis.

A legislação paulista já admitia a instalação do juízo arbitral para resolver as pendências oriundas dos contratos de serviços públicos (lei 7.535/82) antes da própria Lei de Licitação.

Porém, nem todas as questões contidas no contrato administrativo admitem a solução de divergências através da arbitragem: os atos administrativos de império – aqueles em que o Estado age em nome do interesse público –, não admitem transação por parte do agente público.

Especificamente aos contratos de concessão de serviço público, as cláusulas regulamentares (atribuem prerrogativas ao concessionário) não permitem discussão ou alteração pelos contratantes, ao passo que as cláusulas financeiras (encarregam-se do equilíbrio econômico-financeiro entre as partes) admitirão transação do que tiver caráter eminentemente patrimonial, o que somente pode ser apurado na análise do caso concreto.

A arbitragem também pode ser utilizada nos contratos realizados pelas empresas estatais ou sociedades de economia mista, desde que exploradoras de atividade econômica, na gestão interna de seus interesses de caráter patrimonial.

Outros diplomas legais também podem ser mencionados: a lei que regula os serviços de telecomunicações (lei 9.472/97), que permite que nos contratos de concessão firmados pela Anatel seja eleito o foro e o modo extrajudicial de solucionar as divergências; a lei que cuida do setor petrolífero (lei 9.478/9), que permite que sejam estabelecidas as regras sobre conciliação e arbitragem internacional; a lei que trata de concessão de transporte aquaviário (lei 10.233/2001) e a lei que cuida do Mercado Aberto de Energia (lei 10.433/2003), admitem expressamente a adoção do juízo arbitral.

O mais importante disto tudo é que o uso da arbitragem nos contratos administrativos significa o alcance rápido de um acordo, sem necessidade de recorrer ao Poder Judiciário, evitando-se com isto a demora de anos ou até décadas para um resultado útil, adequado e satisfatório aos interesses de todos.

(Camila Sant´Ana David de Souza - ) Advogada associada do escritório Stuber – Advogados Associados.)

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