24/05/2003 - Arbitragem para solucionar problemas

A arbitragem pode ser uma nova alternativa para o consumidor na solução de problemas com fabricantes e fornecedores. Tradicionalmente adotado por grandes empresas para resolver questões nas áreas comercial, empresarial e trabalhista, o procedimento começa a ser aplicado para sanar questões relativas ao direito do consumidor.

Regulamentada no Brasil pela Lei 9.307/96, a arbitragem tem por objetivo solucionar disputas analisadas por árbitros dos tribunais, câmaras ou conselhos arbitrais, órgãos particulares que funcionam como os cartórios na Justiça. Escolhidos pelas partes, os árbitros são especialistas no assunto a ser resolvido (médicos, engenheiros, economistas) e conhecedores das normas aplicáveis à matéria, não sendo necessariamente bacharéis em Direito. A sentença arbitral é válida independentemente de homologação judicial e só pode ser levada a juízo em caso de não cumprimento por uma das partes, quando deverá ser executada judicialmente.

A General Electric (GE) foi uma das pioneiras no uso da arbitragem junto aos consumidores. Em março desse ano, a empresa firmou convênio com o Conselho Arbitral do Estado de São Paulo (Caesp) para submeter, dentre outras, questões de consumo à análise arbitral. O diretor jurídico da empresa, Eloy Andrade, explica que a GE sempre foi partidária da arbitragem e tem incluído a chamada Cláusula Compromissória, que a institui, como cláusula padrão de seus contratos com empresas.

- Pesquisamos bastante antes de escolher um tribunal com larga experiência, como é o caso do Caesp, para firmarmos o convênio. Não colocamos em prática o projeto no Rio de Janeiro pois não encontramos o tribunal com o grau de experiência desejado, já que é um mecanismo relativamente novo - afirma.

O consumidor que concordar em se submeter à arbitragem deverá receber assistência jurídica gratuita do Caesp. A GE arcará com os custos da arbitragem, tendo sido estabelecida contribuição mensal média cujo valor não é revelado. Essa, entretanto, não é a regra geral, já que na arbitragem as despesas costumam ser divididas entre as partes.

Muitos casos são resolvidos em até 20 dias

Segundo o presidente do Caesp, Cassio Telles Ferreira Netto, esse é um meio de oferecer um diferencial ao consumidor, acelerando a solução do conflito - que pela Lei 9.307/96 deve durar no máximo seis meses - e conseqüentemente, seus custos. "Muitos casos são resolvidos em até 20 dias e, nesse tipo de causa, as custas variam entre R$ 200 e R$ 1 mil. Já atuamos em algumas demandas de consumidores que foram bem sucedidas. Em um dos casos a questão envolvia uma consumidora que teve reação alérgica a um cosmético e foi resolvida por uma árbitra que era médica, o que facilitou", conta.

Adesão tem que ser voluntária

Advogado e diretor jurídico da Câmara de Arbitragem da Fundação Getúlio Vargas no Rio, Pedro Paulo Cristófaro explica que o Código de Defesa do Consumidor considera abusiva e nula a cláusula que institui compulsoriamente a arbitragem em um contrato de consumo. Assim, não podem constar dos chamados contratos de adesão sem a anuência prévia do consumidor. "Isso não impede, porém, que o consumidor se submeta voluntariamente à arbitragem", afirma.

Diretor de programas especiais da Fundação Procon-SP, Dante Kimura tem restrições à arbitragem para o consumidor. Ele diz que direitos coletivos e difusos, que atingem um universo maior de pessoas, não são passíveis de submissão à arbitragem, que não contempla direitos de caráter indisponível. Outro aspecto seria a redução da transparência, já que a arbitragem exige sigilo.

- Por determinação do Código de Defesa do Consumidor, o Procon divulga o cadastro de empresas com mais reclamações, o que não acontece nos tribunais arbitrais - diz. Além disso, os órgãos de defesa do consumidor podem impingir sanções às empresas, como multas.

Kimura questiona ainda a imparcialidade dos tribunais em casos em que a empresa faz convênios com as entidades de arbitragem. Isso pode resultar numa menor proteção do consumidor, parte mais frágil do contrato. "A constituição prevê que a lei não pode excluir da apreciação do judiciário lesão ou ameaça a direito, por isso, o consumidor poderia recorrer ao judiciário dada a sentença arbitral que ferisse direitos além do que foi negociado", afirma. A questão, entretanto, é controversa pois para alguns juristas a sentença arbitral seria irrecorrível.

Formas alternativas aos Procons

O diretor da Fundação Procon não acredita que o papel da entidade ficará esvaziado caso a arbitragem venha a ser difundida. "Já existem formas alternativas aos Procons como os Juizados Especiais, ouvidorias e Serviços de Atendimento ao Consumidor das Empresas. Os órgãos de defesa do consumidor atuam tanto na composição de conflitos como também preventivamente, com função didática. A conscientização do consumidor fará com que recorra a eles quando outros mecanismos, no caso a arbitragem, ferirem seus direitos", avalia.

Fonte:
Jornal do Comércio do Rio de Janeiro
Autor: Mariana Durão

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