A ARBITRAGEM NO PROCESSO DO TRABALHO
Yvila Maria Pitombeira Coelho

A lei 9.307 de 24 de setembro de 1996, consolidou no atual ordenamento jurídico o instituto da arbitragem, com o nítido escopo de oferecer a justa, célere e eficaz resolução dos conflitos , sendo mais uma forma alternativa de que se pode valer o Estado para a pacificação dos interesses intersubjetivos.

No campo do Direito do Trabalho, desde o início do século, com a publicação do Decreto 1.073 de 05 de janeiro de 1907 a arbitragem conhece tratamento específico. A partir daí é que foram surgindo novas normas para regulamentar o instituto , tais como, as de natureza constitucional insertas no art. 114 §§ 1º e 2º da Carta Maior , onde se consagrou a juridicidade da arbitragem trabalhista como forma legal de solução dos conflitos.

Inobstante a remota origem do instituto e seus objetivos que culminam inegavelmente no descongestionamento do Poder Judiciário, posto que, legítima via alternativa de resolução conflitual, a arbitragem tem encontrado a anacrônica oposição de alguns setores do mundo jurídico que defendem a idéia de que a aplicação de tal instituto acarretaria uma regressão histórica da justiça primitiva, quando não, consequente privatização do processo, negando aos litigantes o livre acesso ao poder judiciário.

Baseando-se nas teses levantadas por opiniões contrárias à firmação da arbitragem não somente no processo trabalhista, mas em todo o mundo jurídico, é que tentar-se-á aludir no decorrer deste trabalho a gama de benefícios trazidos por este instituto como mecanismo extrajudicial de solução conflitual muito distinto da jurisdição estatal, tendo em vista a sua grande elasticidade ritual e facilidade de acesso.

A repulsa para com o instituto da arbitragem dá-se efetivamente frente à idéia de que tal dispositivo excluiria do Poder Judiciário lesão ou ameaça de direito, afrontando o disposto no art. 5º XXXV da C.F. No entanto, a Lei 9.307/97 ao dispor sobre o juízo arbitral simplesmente objetiva garantir mais uma faculdade de solução das lides, e em momento algum será negado às partes o direito à tutela Estatal .

A opção voluntária das partes pelo procedimento arbitral há de ser respeitada, e , embora tal opção se direcione a uma atividade não _ estatal de solução jurisdicional dos conflitos, tal atitude à luz dos arts. 6º, 7º, 33 e 34 da Lei 9.307/96 não rechaça a jurisdição estatal, já que mencionada norma deixa sempre aberta a porta do judiciário nas circunstâncias de vícios e defeitos graves do laudo arbitral.

Tendo em vista que ninguém é obrigado a demandar, podendo permanecer inerte diante de uma afronta ou ameaça de direito, é legitimamente viável aos jurisdicionados a escolha amigável de um terceiro para solucionar os interesses em demanda. "Pensamento adverso, traduz um visão retrógrada e autoritária, inviabilizadora de formas alternativas de soluções de conflitos destinados a tornar mais simples e efetiva a resolução dos conflitos de interesse".(1)

Outro ponto relevante acerca da violação de dispositivos constitucionais pela lei de arbitragem se encontra na idéia de que todos os cidadãos possuem direito a um julgamento realizado por um juiz imparcial, inexistindo lugar para Tribunais ou juízes de exceção.

Nenhuma transgressão, entretanto, ocorre contra este preceito, eis que o juízo arbitral encontra-se legalmente previsto em momento anterior ao que ocorre o fato a ser julgado, não existindo portanto, qualquer julgamento de exceção. Além disso, goza o árbitro de jurisdição autorizada pela Constituição (art. 114), pela Lei e acima de tudo pela vontade dos litigantes.

Na lição do ilustre jurista Armando Couce, esta atividade jurisdicional existe a partir do momento em que "se afasta a equivocada idéia de que somente ao judiciário é atribuído o poder de julgar e solucionar os conflitos (art. 52, I, "d", da CF) . A superação extrajudicional dos litígios, por sua vez, está igualmente na alçada dos particulares, mediante a transação, conciliação, negociação, mediação e a arbitragem".

Isto posto, em momento algum o judiciário perderá o seu lugar , pois a Lei de arbitragem não cria um novo órgão jurisdicional, e, consequentemente, nos casos em que ocorrer má atuação do árbitro, o amparo do órgão jurisdicional competente virá por meio de medidas coercitivas, antecipatórias e cautelares (art. 22 § 4º ) como intervenção exclusiva do Poder Estatal.

Uma outra questão pertinente gira em torno do fato de que a arbitragem no âmbito das relações laborais é agasalhada pela própria Constituição Federal como meio de solução dos conflitos coletivos de trabalho .

De fato a arbitragem na esfera individual está limitada a direitos patrimoniais disponíveis ( art. 1.º da Lei n.º 9.307/96) , sendo que o ponto de partida no Direito do Trabalho é justamente a indisponibilidade dos direitos consagrados em suas regras imperativas quando não de ordem pública.

Saliente-se entretanto que, nem todas as normas trabalhistas são de ordem pública e imperativas e, por consequência, indisponíveis os direitos . Com efeito, boa parte das normas alusivas ao contrato individual de trabalho são dispositivas e tal disponibilidade existe porque o direito é privado e patrimonial, sendo igualmente privado o interesse tutelado pela norma.

Não se pode olvidar que na esfera trabalhista certos direitos e vantagens oriundos da relação empregatícia são passíveis de negociação e transação em juízo, em sendo assim, é certo que a arbitragem está perfeitamente apta a coexistir com a justiça do trabalho; uma não exclui a outra, já que a arbitragem atuará apenas supletivamente nas ações individuais que versem sobre direitos disponíveis como meio opcional nos dissídios coletivos.

Constata-se por consequinte que, o referido instituto servirá como meio auxiliar para melhor administração da Justiça Especializada, diminuindo o volume de processos, e com isso, permitindo uma prestação jurisdicional mais célere e eficaz, já que nem o Poder Judiciário e nem a Justiça do Trabalho vêm atendendo aos clamores da sociedade por uma justiça rápida e eficiente.

Quanto ao alto custo da arbitragem abordado como empecilho para sua utilização, tem _ se a aduzir que tal argumento improcede diante das múltiplas possibilidades das despesas serem negociadas em acordos ou convenções coletivas de trabalho, ou serem destinadas a cargo do empregador. Ressalte-se que, se envolvidos na escolha de tal instituto estiverem presentes sindicatos, associações ou empresas o problema sequer existirá, além disso, é absolutamente notório que a gratuidade da Justiça Trabalhista está longe de ser uma realidade , posto que com o advento da Lei 5584/70 todos os empregados que percebam acima de dois salários mínimos , em geral, estão sujeitos ao pagamento de custas e despesas processuais. Daí se extrai a conclusão de que desvantagem alguma traria a aplicação da arbitragem na solução das querelas trabalhistas.

O uso da arbitragem no processo do trabalho só traria benefícios tanto aos litigantes como aos próprios magistrados, que poderiam dispor de mais tempo para o estudo e análise em torno de questões de maior complexidade e por consequência, prestar a jurisdição com melhor qualidade , contribuindo assim para o desingessamento do Poder judiciário e a célere pacificação dos conflitos.

Vale trazer a baila as sábias palavras do ilustre desembargador CLÁUDIO VIANNA DE LIMA, prolatadas em favor do tema abordado, de onde se extrai que: "Vence-se, na verdade, uma etapa, no Direito Brasileiro, em que o Instituto da Arbitragem, foi, sempre, maltratado pelo legislador e pela própria lei. Em decorrência de preconceitos , injustificáveis, contra a solução de conflitos pelos particulares, fora da Justiça do Estado, e da dificuldade, generalizada, de se assimilar o instituto, que tem o seu fundamento no princípio, universal, da autonomia da vontade, no consenso das partes, e não no poder soberano do Estado, impondo decisões por julgadores de sua escolha."

Por fim, infere-se que a arbitragem é plenamente aplicável em sede trabalhista, não sendo, como muitos afirmam, mecanismo utópico; ao contrário, com sua correta aplicação e o conhecimento acurado de suas técnicas, poderá ser a fórmula que se busca para o perfeito atendimento da justiça àqueles que incessantemente nela se amparam.

Yvila Maria Pitombeira Coelho é Advogada do escritório Cleto Gomes Advogados Associados em Fortaleza - Ce

Retirado de www.faroljurídico.com.br

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